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Pampas frágeis
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A ESCOLA PRIMÁRIA

  • Foto do escritor: Marco Alves
    Marco Alves
  • 26 de mai. de 2020
  • 3 min de leitura

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Com apenas cinco anos, era chegado o meu primeiro dia de escola. (Tenho a dizer que não foi fácil). Um miúdo, habituado em casa, entrar num mundo diferente e com pessoas mais velhas ao redor, causou, necessariamente, um certo temor.

Como não tive ensino pré-escolar, (sim, é verdade, no meu tempo, isso só na cidade), entrei na escola muito acanhado. Aquele rapaz branquinho e sardento, tinha feito o caminho a pé sozinho. Que conquista!

A escola tinha uma entrada principal, depois, o edifício, mesmo unido, tinha duas portas, a da direita e da esquerda, com dois pisos. A minha sala fica na porta direita, do piso inferior, e a sala, também, logo à direita. Era assoalhada e repleta de mesas e cadeiras normais para a minha altura, mas que recordo, agora, como tão pequeninhas.

Entrei e sentei-me na primeira fila e fui observando os meus colegas de turma. Pouco depois, a professora entrava na sala. Uma mulher vistosa, bem maquilhada, chamava-se dona Cândida. As primeiras aulas serviram para ajustamento dos lugares. O Berto numa secretária ao lado da professora, eu ficava ao lado da Natálio e, ao lado, o Pedro e a Zeza.

Quase todos nascidos no ano de 1976… havia respeito, humildade e responsabilidade… a Escola.

Quando tocava a campainha, era hora do recreio. E tanto se recreava…

Depois do levantamento do leite achocolatado, saíamos todos a correr para a terra. Era, de facto, naquela terra barrenta, que nos íamos conhecendo melhor. Entre jogos e brincadeiras, sobressaiam, essencialmente, as genuínas risadas. O pião, o espeto, a macaca, os berlindes, a corda, o garrafão, o futebol com e sem bola, entre tantas outras atividades, propiciavam uma competição muito sadia. Todos queria ganhar, mas não deixava mossa nos derrotados.

Na parte traseira, havia muito espaço. Um campo de futebol e outro, divido por um muro de pedra, para outras atividades. Tínhamos acesso por carreiros, onde surgiam várias grutas e buracos, escavados pelas mãos de todos.

De volta à sala de aula, todos entravam transpirados e abraçados.

Foi ali que aprendi cada letra do alfabeto, cada número, cada símbolo. Não imaginava que viessem a ser tão importantes na minha vida. A aprendizagem de cada matéria parecia sempre igual. Havia uma naturalidade que não permitia que se tivesse a consciência que tantos conteúdos iam ficando cimentados.

Na secretária da professora, havia uma cana da índia amarela e uma régua de madeira. Que pavor! Devo ter levado umas “canadas”, mas “reguadas”, não! Foi mais uma conquista!

Cantarolar a tabuada, olhando para o lápis branco cabulado, era uma sinfonia quase diária: 1x1, 1; 1x2, 2... Havia alegria, vontade de aprender e de colaborar.

A dona Cândida, a professora, conseguia ter sempre a sala disciplinada. Ela não era má. Era uma pessoa que tinha “nascido para aquilo”. Cumpria a sua função exemplarmente. O seu marido era fotógrafo e apoderava-se de nós uma alegria enorme, quando ele vinha à escola. Mais um ano, mais um quadro e uma fotografia. (Nesse dia íamos sempre um pouco mais arranjadinhos).

Dia, igualmente, feliz era o Natal com aquelas colagens de pais natais, nas janelas. No Carnaval, eram as máscaras e no Dia da Árvore, no espaço da escola, plantavam-se mais algumas árvores, para nós, uma grande satisfação e orgulho.

Mas se havia momentos de euforia, também havia temorosos… Era o chamado “dia das picas”. Vinham os enfermeiros, (acho que lhes chamávamos os médicos), à escola verificar as vacinas.

- Este ano não levo, este levo! (Que suplício!)

Mas era só um dia… para a frente, surgiam sempre novidades.

A determinada altura, a dona Cândida ficou de licença. Apareceu uma nova professora… e agora?

Era a professora Júlia. Foi por pouco tempo, no entanto, quem diria que, quase quarenta anos depois, a minha filha a viesse a ter como professora também. Hoje, fico muito feliz, porque sei que está bem entregue. (Eu também sou professor, mas reconheço que, outrora, ser-se professor era ser-se professor. Não, não me enganei, nem repeti… antigamente, o professor era valorizado e respeitado. Dizia-se que as pessoas mais importantes eram o professor e o padre).

O ensino primário passou rapidamente. No entanto, devo dizer que foi vivido intensa e afirmativamente. Ainda que se diga que as crianças são pouco responsáveis, devo dizer, por experiência própria, que a minha geração foi deveras fantástica.

Agora, adulto, posso recordar e comparar. Vivemos aquela Escola como ela deve ser vivida. Valorizámos cada momento e reconhecemos a sua enorme importância, agora.

𝗡𝗶𝗻𝗴𝘂é𝗺 𝗻𝗮𝘀𝗰𝗲 𝗲𝗻𝘀𝗶𝗻𝗮𝗱𝗼, 𝗻𝗶𝗻𝗴𝘂é𝗺 𝗽𝗼𝗱𝗲 𝗰𝗼𝗺𝗽𝗿𝗮𝗿 𝗮 𝗮𝗽𝗿𝗲𝗻𝗱𝗶𝘇𝗮𝗴𝗲𝗺. 𝗔 𝘃𝗶𝗱𝗮 𝗳𝗮𝘇-𝘀𝗲 𝘃𝗶𝘃𝗲𝗻𝗱𝗼, 𝘁𝗮𝗹 𝗰𝗼𝗺𝗼 𝗮 𝗳𝗼𝗿𝗺𝗮çã𝗼 𝗱𝗲 𝗰𝗮𝗱𝗮 𝘂𝗺 𝗱𝗲 𝗻ó𝘀.

𝗧𝗲𝗻𝗵𝗼 𝘀𝗮𝘂𝗱𝗮𝗱𝗲𝘀 𝗱𝗼𝘀 𝘁𝗲𝗺𝗽𝗼𝘀 𝗱𝗮 𝗺𝗶𝗻𝗵𝗮 𝗲𝘀𝗰𝗼𝗹𝗮, 𝘁𝗲𝗻𝗵𝗼 𝘀𝗮𝘂𝗱𝗮𝗱𝗲𝘀 𝗱𝗮𝗾𝘂𝗲𝗹𝗮 𝗘𝗦𝗖𝗢𝗟𝗔!


Marco Alves, 26 de maio de 2020

 
 
 

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